segunda-feira, setembro 06, 2010

who are you

       
ca'los c'ús. era assim que, na idade tenra, a minha irmã chamava o apresentador do 123. era o seu predilecto. estava na inocência de achar, ou de nem pensar, que um homem só deseja uma mulher para lhe dar beijinhos e ser mãe de filhos. que um homem só deseja uma criança como pai, ou como irmão mais velho, para a amar candidamente. nunca para encontrar na sua pele doce o que não encontra no companheira/o. nunca para encontrar nas suas entranhas algum prazer.

saiu esta 6aF no Público uma reportagem sobre o Parque Eduardo VII. falava-se dos cenários que se criam. da prostituição por prazer, por dinheiro. das fugas às rotinas. das rotinas alternativas. e das personagens. o sérgio é casado e a mulher "nem sonha que ele faz aquilo". ele vai buscá-la ao emprego, jantam, conversam e fazem amor. só depois, pela calada da noite, enquanto ela dorme, vai satisfazer os outros. ela não lhe conhece as faltas. as necessidades. desconhece-lhe a incompletude que o preenche e que, noite após noite, procura numa vida pouco bem vista aos olhos da sociedade convencional. estes familiares são outsiders. são gentes que vivem na incredulidade que estas coisas acontecem perto. o que ouvem são estórias que se contam, estórias de gentes doentes. mas, acima de tudo, de gentes distantes.

quando os noticiários anunciaram o escandâlo dos meninos da casa pia e dos seus intervenientes, descaiu-nos o queixo. caiu perante o povo, e caiu perante as famílias dos acusados. como se lida com isto? com um lado lunar que desconhecemos e que faz parte de quem amamos? é passível de ser amado? prefere-se acreditar e perdoar, ou é preferível negar e acreditar no que o parceiro nos assegura? de qualquer das formas, é preciso muito amor. ou muita "logística".

depois das sentenças lidas, passou-me pela cabeça a possibilidade de eles serem 'inocentes'. dessa ínfima possibilidade que tantas vezes escapa às mãos da justiça. da possibilidade de haver essa possibilidade. e ficou a dúvida. a germinar. mas absolvidos ou não um dia, o povo julgou o que ouviu. e foi inflexível. após a confiança traída, não há veredicto que lhes volte a caiar as vidas.

depois das sentenças lidas, ficam as mulheres dos réus. as famílias. pois ainda que declarada persistentemente a inocência, fica a pairar, como abutre incansável, a possibilidade de eles serem mesmo culpados.


(não há nada mais corrosivo do que a dúvida. quando a confiança é abalada, é ela que lhe destrói as bases.)
       

 

7 comentários:

João disse...

"o que tu fazes fala tão alto que não se ouve o que dizes" (desconheço o autor).

:( disse...

Era "Calos...", não Carrrrrrlos... era outra quem dizia "carrrrrrrrne".

menina de porcelana disse...

senhora s.: calos então. ;)

joão: aguda a frase, grita. o problema é que o que tu "fazes" não é lido imparcialmente, mas pelos olhos subjectivos de quem ama...
(quando o Liedson cai na área, pode ser penalty ou não...)

Anais Nin disse...

"We don't see things as they are, we see things as we are."

hum...

menina de porcelana disse...

Anaïs Nin pah. ;P
(gostava de ver o Henry & June. foi daqui que o Tarantino tirou as meninas para o Pulp Fiction! :) )

menina de porcelana disse...

(cont.)
joão: (...) mas pelos olhos subjectivos de quem ama... e de quem odeia...

:'S

(a dúvida... houve?) disse...

https://www.theguardian.com/world/2016/may/07/discovered-our-parents-were-russian-spies-tim-alex-foley

The day we discovered our parents were Russian spies

(by Shaun Walker, 7 May 2016)