sexta-feira, fevereiro 26, 2010

O princípio da incerteza



peguei na janela do tempo e espreitei o futuro. vi-me lá, junta e com filhos no colo. pensei nisto.
voltei a espreitar. agora era eu apenas. e tinha um rebento lindo. pensei nisto.
vi outra vez. viajava, até ao fim dos meus dias. voltei a pensar.
outra. estava bem. o resto, tudo incerto.


(quando tomamos consciência das coisas acabamos por mudá-las.)


quinta-feira, fevereiro 25, 2010

(as)simetria


olho-os nos olhos. são velhos. passam por mim arrastando-se pelas ruas. olham-me também. vêem-me através da lente baça, e triste. olham-me por fora, cá para dentro. e rebuscam. é um olhar pesado, enorme, que me abraça o corpo. e aperta.

confundem-me, os velhos. aqueles velhos. pergunto-me o que é que eles (me) vêem. como é que eles (me) vêem. lançam olhares calados ao vento, e eu oiço-lhes os sussurros. pedem-me que os espreite por baixo das peles, que lhes veja os verdes anos. ainda. que lhes rasgues as vestes coçadas e os veja homens. (de quando?) mas eu sou menina. e vejo-os velhos. apenas. quero guardar a sabedoria de ver-para-além-das-aparências para os anos vindouros. para quando for velha. de olhar nos olhos e abrir a porta.

mas agora não.

eles olham-me, ainda. perfuram-me. querem-me a juventude. (qual?) amedontram-me, os velhos. aqueles velhos. sentem os últimos grãos na ampulheta e olham-me desesperadamente como se me sugassem a vida. tenho medo de ser como eles. de me tornar como eles.

e a pouco e pouco, nesse medo, sinto-me definhar também. mantenho a cara da menina, e o corpo jovem. mas e o resto? arrasto-me com eles pelas ruas, enquanto me pergunto

quando eles olham para mim, afinal vêem quem?


terça-feira, fevereiro 16, 2010

Actividade experimental




















a Vida pega em nós, mete-nos em frasquinhos, e depois vai fazendo misturas. só para ver no que é que dá.

(pior é que sem saber os objectivos da sr.ª d. experimentadora, como é que pode alguém manipular os resultados?)


domingo, fevereiro 07, 2010

crescer


Estou sentada à mesa do café. Passam na vitrina, para quem vê de dentro, 3 homens e uma mulher. Observo um dos homens e a mulher. Não consigo deixar de pensar se serão um casal. Entra toda a família no café. Há crianças, afinal, também. Sentam-se mesmo ao meu lado, com duas velhas senhoras e um casal amigo. Juntam-se mesas, trocam-se as novas. As meninas sentam-se ao lado da mulher. Ela fala delas com cuidados desvelados. Ela não gosta de usar óculos, mas o médico diz que tem um olho preguiçoso. A menina ri e balbucia qualquer coisa. Reparo na mulher. É bonita. Tem o cabelo esticado e a maquilhagem cuidada. Noto nas olheiras das noites brancas. Pergunto-me se já foi egoísta. Se foi uma jovem embirrenta e cheia de manias. Se mudou quando se tornou mãe. Pergunto-me quantas vezes mudou de vida. Quantas meninas, adolescentes e mulheres já foi? Quantas vontades, quantas incertezas. Pergunto-me se já se encontrou, ou quantas vezes vai ainda mudar.

(quantas vezes podemos mudar, se o tempo corre. pergunto-me se nos encontraremos um dia, tu e eu, cá dentro. quanto tempo até lá, quantos erros. pergunto-me quando será, ou se virá, o dia em que já não desejo mudar.)