quinta-feira, abril 23, 2009

O indivíduo à escala ecológica



















       
           
Ask not what's inside your head, but what your head's inside of.
(Mace, 1977)



(foto: National Geographic [Portugal], Agosto 2008, tema: "China")

quarta-feira, abril 22, 2009

O pior cego

 
Ela apoia o queixo no pulso enquanto leva aos lábios a pequena chávena de café. Depois, numa rotina de 90 minutos, pousa-a e, inevitavelmente, desfia o vazio em pensamentos.

Na TV passa o futebol. Ele, impreterivelmente, entra no jogo. Leva, de tempos a tempos, a cerveja ao goto e solta, de tempos a tempos, palavras imperceptíveis. Ela olha, imagina que sejam para ela, não são. Ele agarra o copo, sustém-se, estrebucha e, súbito!, prescinde temporariamente das imagens. Ela olha. Ele vira-se e rosna algo ao empregado – quer outra cerveja afinal. Depois, pulando o olhar dela, torna a dissipar-se dentro do ecrã.

São os 90 minutos, fora os descontos, o jogo termina. Ele levanta-se, vai pagar. Ela, enfadada, ergue os olhos e arrisca num tom amorfo: Vamos? Ele acena que sim, consente. Ela, de pernas dormentes mas habituada a ficar no banco, levanta-se com vagar, pega na mala, e sai.


(enfim. num mundo em que o tempo não sobra, pergunto-me onde vamos encontrar ‘coragem’ para aguentar estes fretes.)
       

 

segunda-feira, abril 13, 2009

São massas, meu senhor, são massas.


descobri que as hóstias, aquele pedaço de pão imaculado e entregue por uma das muitas mãos de Deus, são feitas às carradas - em massa - por meio de objectos metálicos standardizados.








































(Centro Galego de Arte Contemporânea, Agosto 2008,
Santiago de Compostela)


e confesso que me melindrou um bocadinho.

nem tem que ser lógico. não, nem tem. mas
dá-nos o homem a carne, e que fazemos nós? reproduzimo-la em formato standard para responder às exigências da procura.

pior que isto, só inseri-la no circuito da comercialização.


terça-feira, abril 07, 2009

Estrelas


A judite (de sousa) sorri. Escorre-lhe a franja pela testa sobre os olhos pestanudos. Então, numa felicidade de poder colocar em palavras suas as dúvidas da humanidade, arremessa:
- Mas o senhor professor antónio damásio, ãaa..., julga que, apesar de tudo isso que disse e de tudo o que já se conseguiu até hoje... o que é que nós nunca iremos saber?
O senhor professor antónio (damásio) abisma-se. Mas depois, certo que o mundo inteiro bebe do que irá dizer, controla-se e solta com naturalidade:
- Impossível saber o que nunca se vai saber.

(pois. acontece-me também. antes de começar qualquer coisa nova, antes de entrar, antes de ver, antes de saber como as coisas são por dentro - imperfeitinhas, incertas, e em permanente (des)construção -, acontece-me esperar que o não sejam. calculo que a ciência, quando vista de fora, também seja assim: uma espécie de certeza inabalável com métodos afinados que dão respostas precisas a todas as questões travessas.
então, quando a imprecisão dos tarôts, o enevoamento dos oráculos de bellines, a atribulação das linhas da mão - e a poluição luminosa! - nos impedem de ver as constelações estelares - e o futuro! -, o mundo redescobre a pólvora: vira-se para os neurocientistas. quer saber da "pílula da memória", da felicidade eterna, da vida com muitos dias e mordomias, se puder ser também. enfim, de mimos.
os neurocientistas é que ainda não aprenderam a lidar com tamanhas responsabilidades. por isso, desabituados que estão de 'perguntas às três pancadas', quando lhes fazem questões destas, poêm-nos com a cabeça à roda. e, inevitavelmente, a ver estrelas.)

segunda-feira, abril 06, 2009

Franqueza




















A função de muita gente na vida passa por empatar e obstruir a vida dos outros. Mas, e é coisa com piada, alguns nem tentam disfarçar.

quarta-feira, abril 01, 2009

«As palavras são pedras.»*
















(Chita. Rans, Junho 2008)


(dizem que os olhares não mentem. olhassemo-nos todos assim, para o fundo dos nossos fundos, para os fundos dos outros, e talvez nos entendêssemos muito melhor.

talvez.)


* Ferreira, V., 1994, Aparição.