terça-feira, novembro 29, 2011

"Porque o único sentido oculto das cousas É elas não terem sentido oculto nenhum." (i)

                             


Rambo III (1988), Peter MacDonald.



         
           
(o complexo - a sério mesmo - é resistir a ver o que não se vê, e deixar aparecer o que está à vista.)
         
                   

segunda-feira, novembro 28, 2011

justificações (I)

   
a porta abre-se. a senhora, até então mastigando suavemente uma qualquer patanha industralizada e amarfanhando na mão o respectivo invólucro, recorre a um movimento veloz para arremessar com pontaria o pacote já vazio para o exterior do autocarro.

os meus olhos arregalam-se enquanto, sob o tremendo efeito pop-out, sigo o trajecto do movimento braço a estender-se, invólucro arremessado, movimento braço em repouso. depois, passando esse efeito e começando outro, também o meu olhar se remete ao descanso. a senhora repara que eu reparei. faço por não olhar. a senhora não resiste. tem a formar-se na garganta, já quase a engasgar com o tamanho do novelo que se criou, uma justificação.

- pois... eles dantes tinham, mas agora já não põem caixotes do lixo nos autocarros. não se devia mas... também não dá jeito nenhum andar com aquilo na mão...

- pois..., remeto eu com um olhar fugitivo. na verdade, existem certas partículas da língua portuguesa que substituem silêncios incómodos face a justificações questionáveis mas não questionadas.

          
(se uma pessoa for a ver bem, são realmente incríveis as justificações que arranjamos para aquilo que fazemos. e até mesmo para aquilo que acabamos por não fazer.)
  
            

quarta-feira, novembro 23, 2011

mimos

        
andam os dois na fisioterapia, talvez pela já avançada idade. ela, de estatura baixa, anafadinha, mas bem maquilhada e penteada. ele, alto mas sereno, discreto e humilde. olha-nos com um sorriso escondido, curioso, mas cansado, enquanto vagarosamente muda de posto por entre as máquinas e ferramentas de exercício.

- então homem? toca a acabar isso!, solta ela despachada enquanto sai de uma sessão de gabinete. ele levanta-se, enferrujado e sem pio, ainda que não tenha acabado o exercício.
ela, visivelmente extenuada, e sem aguentar as coxas roliças, senta-se arfante enquanto empunha a bomba da asma:
- ai eu não consigo, tens que ir buscar o carro...

(mas este senhor ainda conduz?, penso eu...)

ele balbucia qualquer coisa de fininho, sempre muito submisso, e acede.
- fazes marcha a trás e apanhas-me aqui à porta.

está bem. ele diz-nos boa-noite num sorriso sumido e segue. a senhora relaxa, olha para nós com as faces rosadas e contentes, e encolhe os ombros. penso que vê em nós empatia. pois. eu imagino. imagino o ar gasto, abatido, mas conformado com que ele deve fazer o curto caminho até ao carro. e encolho os ombros também.



(por trás de uma mulher resoluta, segura e despachada, costuma haver um homem que lhe faz as vontades.)
         
        

domingo, novembro 20, 2011

humano

       
ajustas o micro, dás as últimas afinações na guitarra e soltas o primeiro acorde. a sala, até então em burburinho, sustêm a respiração e estanca no peito o coração. tudo te olha, a ti a à tua guitarra, à forma como a dedilhas gentilmente, como se fosse a pele de uma mulher.
há um ou outro que sussurra ainda, que dá risadinhas finas, outros que se deixam embalar adomecendo. mas, homem ou mulher, apaziguado ou revoltado, todos acabam por te seguir a música embevecidos. e nem que apenas um esboçasse um breve sorriso nos lábios, faria valer a pena essa dança cuidadosa em que enleias os dedos, e o mundo.
       
(há esperança para nós?)
        
          

who are you?

  
      
ao contrário de ninguém, e até muito mais que alguém, acho que somos muitos.
às vezes, até, demasiados.       
           
        
             



quarta-feira, novembro 16, 2011

figuras com estilo (ii)

                                



















(segundo placard da linha. mas haveria mais? não sei. o que eu sei é que, depois de ler duas coisas destas, até me apetece seguir criteriosamente as regras de trânsito.)
           
           
            

segunda-feira, novembro 14, 2011

figuras com estilo (i)

                  
 
(hajam políticas assim. mas a sério.)
       
               
        

quinta-feira, novembro 10, 2011

há de tudo (ii).

           
ele
- like it?
eu
- no, thank you.
ele
- what are you looking for?
eu
- no thank you, i don't want to buy.
ele, sem desistir,
- we have everything, everything is possible!
        
          
(como se chega ao sab kuch milega na Índia. do nada. ou do que quer que seja. e talvez seja por isso que funciona.)
 
         

quarta-feira, novembro 09, 2011

há de tudo.


ele
- want to buy?
eu, desprendendo o olhar de uma peça,
- no thank you.
ele
- how much?
eu
- i don't want it. i'm looking for something...
ele, já eu a afastar-me,
- which kind of something?


(mesmo para indefinidos.)