mas as coisas não surgem do nada. é a torneirinha a pingar milésimas todo o santo dia, é o fiozinho de água do autoclismo a escorrer lentamente pela sanita abaixo, é o cano roto à nanoescala, é a subida gradual de 0.0000001 litros de água nos nossos rios e mares, é o aumento silencioso de 0.001 graus Celcius no termómetro terrestre; é até o grãozinho de pó a pairar, dia após dia, sobre o biblô intocável. e ao fim de um ano, dois, dez ou trinta e sete, a conta a pagar ascende aos milhares; a barragem cansa-se e cede à pressão; o planeta torra; e, sobre o manto branco empoeirado, os objectos - tal como as pessoas - deixam de se reconhecer. basta aquele grão de areia deixado, inconscientemente, instante após instante, à beirinha do caminho para que uma relação derrape e se despiste na curva mais segura da estrada.
ou então surgem, e pronto. despeje-se logo o balde de areia na curva imaculada, e não há passado de confianças inquebráveis, mimos constantes, bilus-bilus, ou camisinha permanentemente alva que, mediante um imprevisto, salvem o parzinho de se atolar.
ou então não. e salva-se.
(é assim o amor. profundamente incompreensível.)